15.7.06

"Alegoria da Caverna" de Nuno Judice

“Todos os cadernos servem para que neles se escreva qualquer coisa, como um poema. E é preciso que um caderno esteja aberto para que a página obrigue o verso a avançar até ao fim da linha, passando a outro verso, até completar a estrofe. Um poema, então, nasce do vazio que se faz quando se abre um caderno. Não tem no seu
[princípio qualquer outra razão; a não ser que a tua imagem se tenha metido no meio, entre a memória e o caderno, deixando na página uma sombra que tento apagar com o poema, como se ele a pudesse absorver, transformá-Ia em versos, estendê-Ia até ao fim da estrofe.

Um poema precisa de viver. E, para isso, não pode
estar à sombra de qualquer coisa, mesmo que essa sombra nasça da tua imagem. Tenho de apagar um deles: poema ou imagem; e
deixar que o caderno se feche quando a decisão ficar tomada, para que
[dentro dele fique o registo dessa noite em que foi preciso decidir entre a memória e a palavra. No entanto, ao acabar o poema, esquecendo-me por
[instantes do seu princípio, tudo volta ao mesmo: e tu estás comigo, isto é, a tua imagem desce-me da memória para o caderno, alastrando pela página até ao fim do poema.

É como se o poema existisse por essa única razão: fixar a tua sombra.”

Nuno Judice

2 Comments:

Blogger vento... said...

No meu canto observo-te sem que tenha a coragem de te diririr uma palavra.
O sorriso inicial desvaneceu dando lugar ao pânico sempre que sinto o teu olhar.

Ainda não encontrei uma explicação lógica para esse medo. Diversas vezes tive vontade de te abordar, mas os cenários que criei fizeram-me recuar.

Talvez se nos encontrassemos fora do local habitual!
Talvez que nos conhecessemos sem precisarmos de estar cara a cara!
Talvéz...

Estas são as palavras que ficaram entaladas, sem que não tivesse tido coragem de as proferir.

15.7.06  
Blogger vento... said...

Gostava que me olhasses de forma diferente. Que conseguisses ver para além da imagem que é apresentada nos breves momentos em que nos cruzamos!

Falo com gente que te rodeia para poder fazer-me mais perto.

Mas a distancia apresenta-se maior.

Tenho saudades...

24.7.06  

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